Sou o que sou

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Sampa, SP, Brazil
Sou terra, por ter razões. Sou berro, se aberrações. Sou medo, porque me dou. Sou credo, se acreditou

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Cantiga simples




Quisera eu poder fazer todas juras
não entoando mais que sete notas
com palavras simples, doces e puras
e que não soasse como reles lorotas

Pudera eu ser tão verdadeiro e nobre
não pulando mais que sete ondas
mesmo que usasse só de rimas pobres
e falasse do teu olhar, quando me sondas

Tivesse eu esse dom da simples poesia
e em versos cantaria todo meu ardor
somente com parcas letras te escreveria

Com o néctar doce e singelo duma flor
simplesmente poucas linhas te desenharia
com sete sílabas, “eu-te-a-mo-meu-a-mor”

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

substância



[a vista é rápida e delineia para sempre outros olhares
avessos, retrospectivos, refletidos, salientes...]

A cor marrom dos móveis antigos, prolifera
como o cheiro de cera que lhes conservam.
No céu, cinco pontos brilhantes giravam em ciranda,
em sentido estroboscópico.Imaculado era o mistério.
A ânsia adrenérgica tomava posse de nossos fôlegos,
e nossos lábios esboçavam um sorriso extasiado.
Nas montanhas distantes, que jazem perto do
rubro por de sol, outras naves pululam, num
jorro de luz e espanto.

“A vinda estava próxima” – anunciava o bailado das luzes.
Os tempos de revelações eram enfim, chegados.
Na infinda estrada longilínea, com o asfalto às costas
e o mar a frente , ventos sopravam o inusitado,
e os povos, dançavam uns, fugiam outros.
Nuns tantos, dominava o medo e a descrença, noutros
o desvelo e a esperança.
De qualquer forma, nada mais seria como até então tenha sido.
Começava o inevitável rito de passagem...

A chuva cai em estereofonia no tecido multicolorido do meu
umbrella, e o chão irregular molha minhas meias rotas,
enquanto o rito celebra o cordeiro, os grãos, o pão e
o vinho sobre a mesa entalhada em toalha bordada,
como o maná prometido ao cotidiano da paz e costumes.
[“santo, santo, santo”, sussurra o diácono , entoando o
mantra que vem do tempo...]
No mercado as gôndolas de frutas multicolorem o
passado eterno, às suas sementes, a seus pássaros...

Adonai !...Adonai !...gorjeia a nova ave aos velhos
povos. Ave verum dicte sun !...respondem em coro
as noivas e seus rebentos anunciados.O mar se acalma
e vira o espelho de cada um dos interpretes.
[sentados em círculo solene, repousam os anciãos guardiães
da velha arca, com suas barbas alvas e sábias]

[a mãe soluçava o filho ido]
as fúcsias formavam rios nas faces, e os olhos olhavam
o nada...A voz soava como vento fantasmagórico, sem nexo
Guarda !...Guarda !...lontano il cuore piangeva sensa sangue
secco per stringere la dona che volava morta...
[Luas de Plutão rodeavam o planeta, como átomos escravizados
pelas lanternas dos suicidas, em fila, nos umbrais do 3º céu,
sinfonias inacabadas]

Toda química lhe escorria pela testa e as lágrimas
pelo rosto e ventas.Provinha-lhe de poucas cores,
nos cabelos pregados em azáfama sobre o
couro cabeludo embebido em sangue.
Já não se lembrava mais das cebolas cortadas,
dos filhos paridos, dos pares partidos...
Já não sentia o fel da bílis vomitada
d’um vinho agro bebido em alguma cama...
Já não sentia o cheiro cigano do esperma que lhe
escorrera pelas coxas deitadas, semi-abertas
em direção aos lençóis de algodão barato...
No auge de seu ciclo, nem lembrava mais
das línguas que lhe tocaram o íntimo...
Morria aos poucos, sorria aos poucos,
em frente ao espelho enferrujado.

[o alquimista acende as vela e derrete o épico]
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